Cláudio Aguiar: outro prêmio

Escritor é agraciado pelo Pen Club do Brasil pelo conjunto da sua obra, em votação realizada pelos sócios

O Pen Clube do Brasil acaba de premiar o escritor Cláudio Aguiar pelo conjunto da sua obra. Poucos dos autores em atividade no país têm uma obra tão rica e diversificada quanto a do autor de Caldeirão, da biografia de Francisco Julião e de um oratório sobre Frei Caneca.

Coincide esse prêmio com os 80 anos de Cláudio Aguiar. Para celebrá-los, saiu uma alentada coletânea, organizada pelo cineasta Rosemberg Cariry, seguida de uma grande exposição no Ceará – depois repetida no Recife. Nesta cidade, que o escritor escolheu para morar a maior parte da sua vida (além de Olinda, Salamanca e Rio de Janeiro), ele também recebeu homenagens pelo aniversário em sessão na Academia Pernambucana de Letras, por iniciativa da revista Pernambuco.

Entre os muitos prêmios já recebidos por Cláudio Aguiar, esse do Pen Clube tem um significado especial pela própria história – 89 anos –, a abrangência do Clube – 150 países, e o critério: trata-se de uma eleição pelo corpo social do clube. Num processo livre e democrático.

Se os topônimos pudessem conduzir quem nasce no lugar, Poranga, pelo que significa, poderia definir o destino estético do seu filho mais ilustre. Poranga, onde nasceu Cláudio Aguiar, significa belo, bonito. O que apenas reitera, teimosamente, as denominações anteriores: Várzea Formosa e Formosa.

Ainda muito jovem, ele trocou o seu município de enorme território (1 309,274 km²) e com uma mínima população de umas poucas centenas de almas, por Fortaleza, com meio milhão de habitantes. Depois, mudou-se para o Recife, tão parca em espaço para os seus mais de 800 mil moradores.  Isso no início da década de 1960.

Filho de camponeses do topo da serra de Ibiapaba, Cláudio Aguiar trouxe na bagagem da memória as grandes tragédias e dramas do seu povo. Mas nunca se limitou a isso, pois vai de um romance de temática histórica e rural como Caldeirão (Prêmio de Romance da José Olympio em 1981) à narração das vicissitudes urbanas de A volta de Emanuel (prêmio da Fundarpe para o mesmo gênero, seis anos depois).

Sobre Caldeirão, na verdade, ele disse que "antes de ser histórico, representa a tentativa de fixar na literatura os passos insubmissos das camadas rurais brasileiras". Num trecho ainda mais esclarecedor de entrevista concedida ao jornalista Valdir Coutinho, há 43 anos, disse Cláudio Aguiar:

"O campo e a cidade não podem ser condições para se concluir que um dado romance assim deva se qualificar. O mais que se pode dizer é que esta condição poderá denunciar, como é o meu caso, uma tendência ou intenção. Eu, filho de camponeses, nascido e criado nos roçados, convivendo com a agricultura e os bichos do mato, logo me vi embebido por aquela atmosfera. Mais tarde, é verdade, me mudei para a cidade grande. mas, quando isto aconteceu já me achava impregnado de tal sorte daqueles ares que foram justamente eles que, mais tarde, rebentariam num tema de romance – Caldeirão – romance de estreia, rigorosamente, uma volta à vida do meu povo, aquela gente abandonada nos campos nordestinos.” (Diario de Pernambuco, 24 de setembro de 1982).

O conjunto da obra de Cláudio Aguiar, além de Caldeirão e A volta de Emanuel, que são romances, inclui diversos outros gêneros. Do ensaio à poesia; dos textos de teatro à biografia etc. Todos permeados pela História. Mesmo nunca sendo cativo da realidade ou do acontecimento, o escritor nunca prescinde disto. A paixão humana e as tensões sociais têm sido os motes constantes dele, que os glosa, há mais de sessenta anos. Num conjunto bem urdido de narrações, onde cabe contar a vida de Lampião tanto quanto uma aventura amorosa de Proust no Brasil. O conjunto da obra de Cláudio Aguiar prova que é possível superar a dicotomia Poesia versus História, da famosa passagem de Aristóteles. Ele sabe contar a história tanto como, de fato, foi, quanto deveria ter sido.