Bienal do Rio: a palavra em pauta

No pénultimo dia de Bienal do Livro, a programação contou com Milton Hatoum, Lina Meruane, Mariana Salomão Carrara, Jeferson Tenório e Itamar Vieira Junior

O último final de semana da edição de 2025 da Bienal do Livro do Rio de Janeiro começou oficialmente neste sábado (21). Mesmo pertinho do fim, todos os espaços do evento ainda mantém uma experiência diversificada com nomes consolidados e emergentes da literatura nacional e nomes internacionais. 

Mais uma vez, o centro de convenções Riocentro, onde o evento acontece desde o dia 13 de junho, esteve bastante cheio, especialmente no pavilhão 4, onde se localizam o palco Apoteose (principal palco do evento), auditório Ziraldo e uma grande quantidade de estandes de editoras. Mesmo assim, nada desanimou o público, que esteve presente tanto para comprar novos livros, quanto para presenciar as mesas de conversa entre diferentes escritores. 

Literatura, memória e Palestina

A escritora chilena Lina Meruane


Logo às 12h, o Café Literário deu início a sua programação do dia com uma conversa entre os escritores Milton Hatoum, a chilena Lina Meruane e a portuguesa Alexandra Lucas Coelho. A mediação da conversa ficou a cargo da editora Laura Di Pietro. Em relatos emocionantes, os escritores compartilharam suas experiências com a Palestina, a região de Gaza e, no caso de Milton e Lina, a memória de suas famílias, que são respectivamente libanesa e palestina. Através da palavra e da linguagem, os autores dialogaram sobre as formas de colonização e, sobretudo, acerca da Palestina no passado e no hoje. 

Milton Hatoum

O escritor participou da mesa "Palavra em resistência: literatura, memória e Palestina"

“São exatamente essas imagens meio nebulosas, sem muito contorno, que já não são mais retratos fiéis do passado… é sobre isso que a imaginação vai agir. Nesse sentido, a memória é uma irmã siamesa da imaginação”, afirmou o escritor amazonense Milton Hatoum.

De pais para filhos

Renata e Paula Félix, dupla de mãe e filha que frequentam a Bienal

Entre o grande público da Bienal do Livro, a quantidade de famílias chamou a atenção. Fosse uma mãe com filhos pequenos, um pai carregando as sacolas de livros da filha adolescente ou de todo e qualquer outro jeito, o fato é que pais, leitores ou não, parecem dispostos a levar e comprar diversas obras para os filhos que enxergam na leitura uma atividade prazerosa. 

Carregando uma mala amarela pelos corredores, por exemplo, estavam a dupla de mãe e filha Renata e Paula Félix, respectivamente. Professora, Renata contou que já visitou a Bienal diversas vezes, tanto com seus alunos quanto com a filha de 29 anos, que é uma apaixonada pela leitura desde muito nova. Sobre sua adoração pela leitura, Paula explicou:“Minha mãe é professora, então todos os anos nós viemos para a Bienal vários dias. Desde pequena eu tenho o hábito da leitura, então isso sempre foi muito natural. Eu brinco que é desde que eu nasci”.

De Teresópolis, município do interior do estado do Rio de Janeiro, Pedro trouxe a filha, Alice, de 13 anos, para a Bienal com a intenção de comprar os livros e mangás que ela desejava. “É um evento bem cultural e participar disso com ela é bem interessante”, compartilhou o pai. Alice, por sua vez, contou que achou a obra que mais queria comprar: o mangá Nana. “Lá em Teresópolis era muito mais caro e aqui nós achamos ele com um preço mais acessível. Eu cheguei aqui já procurando”, completou. 

A palavra que nos une

Conversa entre Jeferson Tenório, Itamar Vieira Junior e Mariana Salomão Carrara

Diante da mediação bem-humorada do escritor e criador de conteúdo, Pedro Pacífico, três escritores atuais da literatura brasileira se reuniram para dialogar sobre a palavra. Itamar Vieira Junior, Mariana Salomão Carrara e Jeferson Tenório são os escritores por trás de livros best-sellers e sucesso de vendas e já começaram a conversa buscando respostas para entender o grande sucesso de suas obras. “Me desculpem a autoestima, mas é porque nós somos bons”. brincou Jeferson sobre isso, antes de completar: “A gente tem que escrever o melhor que a gente puder porque sabemos que a história da literatura passou por cima de muita gente boa, muitos escritores foram deixados de fora e a gente, quando começa a escrever, entregamos tudo. Eu acho que passa por isso, de entregarmos o melhor que a gente puder”. 

Obras identitárias?

Itamar Vieira Junior

Por várias vezes, desde o lançamento de seu primeiro livro, Torto Arado, Itamar Vieira Junior recebeu várias críticas sobre sua escrita ser “identitária” demais. Sobre isso, ele respondeu:

“Eu acho isso um pouco infantil e revela um completo desconhecimento do que é identidade, porque todos nós temos identidade, não importa se você é uma pessoa branca, se você goza de privilégios que a sua identidade lhe confere. Eu já vi bons autores brancos brasileiros, por exemplo, que escrevem sobre a sua comunidade judaica e em todo livro aparece isso. O que é isso, se não identidade? Por que só é identitária quando é escrita por pessoas negras e indígenas? A questão é essa”. 

Só sei que foi assim

Já no horário da noite, a Praça Além da Página se transformou em um aconchegante cinema ao ar livre para a exibição especial de O auto da compadecida, filme de Guel Arraes baseado na obra mais célebre de Ariano Suassuna. O escritor e dramaturgo paraibano, porém radicado pernambucano faleceu em 2014, mas completaria 98 anos em 2025 e a exibição do longa-metragem foi mais uma maneira de homenagear o legado imenso desse patrono das artes. No dia 16 de junho, dia exato de seu aniversário, a Bienal do Livro contou com a presença do seu neto, João Suassuna e do Movimento Armorial para um cortejo regado a música, poesia e dança pelos pavilhões do Riocentro, onde acontece o evento.