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No imaginário coletivo, o Natal sempre figura como época de confraternizar, reafirmar laços (principalmente os familiares). Na literatura brasileira, entretanto, muitas vezes encontramos um tratamento diverso: o Natal serve como mote para se pensar a solidão ou problemas sociais. É nessa categoria que se enquadra boa parte dos textos abaixo - uma breve seleção de narrativas ainda pouco lidas. 

Para ler os textos completos, basta clicar no nome em itálico (que está com cor diferente).

 

 

 A noite em que os hotéis estavam cheiosde Moacyr Scliar

"O casal chegou à cidade tarde da noite. Estavam cansados da viagem; ela, grávida, não se sentia bem. Foram procurar um lugar onde passar a noite. Hotel, hospedaria, qualquer coisa serviria, desde que não fosse muito caro.

Não seria fácil, como eles logo descobriram. No primeiro hotel o gerente, homem de maus modos, foi logo dizendo que não havia lugar. No segundo, o encarregado da portaria olhou com desconfiança o casal e resolveu pedir documentos."

 

Boleros de Natalde Luís Henrique Pellanda

"No primeiro boteco que eu encontrasse aberto, decidi. E azar, para que tanta prudência? Havia a promessa bimilenar de uma noite feliz, vivíamos a véspera de um dia de festa, comunhão e nada mais, Jesus nasceu, morreu e nos livrou das bestas, e se o vício era a minha bandeira de guerra, a fé seria o meu salvo-conduto. Cristão nenhum morre com um peru de Natal no estômago."

 

Jingobel, Jingobel (Uma história de Natal)de João Ubaldo Ribeiro 

"Então o Natal aqui é isso mesmo, é a televisão, é Alma de Jegue sacudindo os quibas e por aí vai, ainda mais quando chove assim, porque quando a gente sai batendo os tamancos pelo meio das poças nessas horas, a gente pensa às vezes que não há nada aqui, só nós mesmos, que estamos ali batendo os tamancos."

 

Milagre do Natal, de Lima Barreto

"O jantar foi. acabando triste, com essa história de promoções para o Natal.
Dona Sebastiana quis ainda animar a conversa, dirigindo-se ao marido:
- Não queria que me dissesses os nomes, mas pode acontecer que seja o promovido o doutor Fortunato ou... O "Seu" Simplício, e eu estaria prevenida para a uma 'festinha'.
Foi pior. A tristeza tornou-se mais densa e quase calados tomaram café."

 

Natal na barca, de Lygia Fagundes Telles

"Não quero nem devo lembrar aqui por que me encontrava naquela barca. Só sei que em redor tudo era silêncio e treva. E que me sentia bem naquela solidão. Na embarcação desconfortável, tosca, apenas quatro passageiros. Uma lanterna nos iluminava com sua luz vacilante: um velho, uma mulher com uma criança e eu."

 

 

Natal, de Rubem Braga

"De repente um carro começa a buzinar com força, junto ao meu portão. Talvez seja algum amigo que venha me desejar Feliz Natal ou convidar para ir a algum lugar. Hesito ainda um instante; ninguém pode pensar que eu esteja em casa a esta hora. Mas a buzina é insistente. Levanto-me com certo alvoroço, olho a rua e sorrio: é um caminhão de lixo. Está tão carregado, que nem se pode fechar; tão carregado como se trouxesse todo o lixo do ano que passou, todo o lixo da vida que se vai vivendo. Bonito presente de Natal!"

 

Nossa! O que há com o teu peru?, de Hilda Hilst 

"Sim, é verdade, eu tenho medo das gentes, pra dizer a verdade eu me cago de medo das gentes! O que eu tenho visto de pulhas, de máscaras atadas dia e noite sobre umas caras de pedra... O que eu tenho visto de mesquinharia, de crueldade, de torpeza, de estupidez... Que Natal? Que Natal? mudou o quê depois do nascimento do bebê?"

 

Organiza o Natalde Carlos Drummond de Andrade

"A morte não será procurada nem esquivada, e o homem compreenderá a existência da noite, como já compreendera a da manhã."

 

Torturas de Natal, de Caio Fernando Abreu

"Cada vez que olho esta fotografia tenho uma espécie de susto, e penso obviedades do tipo: 'Meu Deus, o tempo existe!'. Tirada no Natal de 1956, ela tem - cruzes! - 34 anos. Todo Natal, era sagrado, minha mãe emperiquitava a mim e a meu irmão Cláudio com modelinhos de linho branco e odiosas meias soquete, com elásticos eternamente frouxos, que acabavam escorregando patéticos pelas canelas finas - e chamava o fotógrafo."

 

Um personagem de Natal, de Ronaldo Correia de Brito 


"Minha avó confeccionava os enfeites da lapinha com lã de ciumeira e de barriguda. O pouco tempo livre de que ela dispunha, entre os trabalhos e as rezas, ocupava naquele artesanato minucioso, dando vida a carneiros, bois, burros e camelos. As figuras de José, Maria e dos Reis Magos, de louça modesta, eram as mesmas dos outros anos. Mais bonita que a lapinha da nossa avó, só mesmo a das irmãs gêmeas Alice e Alzira, famosas em todo o Crato. O ano tornava-se curto para elas construírem a cidade cenário que ocupava quase uma sala."

 

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