Pedro Melo

Mário Cau, Daniel Brandão e Ricardo Manhães foram alguns dos artistas que participaram dos dois primeiros volumes do projeto MSP 50 (Daniel no primeiro livro, e Mário e Ricardo, no segundo). Nessa entrevista, eles explicam por que decidiram revisitar os personagens clássicos da Turma da Mônica os envelhecendo, e com que elementos desses personagens-patrimônio eles conseguem criar identificação.

Como leitor da Turma da Mônica, quais os motivos que lhe fazem entender o sucesso desses personagens por tanto tempo?
Mário Cau - A Turma da Mônica tem elementos essenciais para uma série: personagens carismáticos e divertidos, histórias com temas e climas variados... E mais que isso, as histórias da Turma da Mônica são atemporais. Salvo algumas referências ao contexto da época, você pode ler qualquer HQ da Turma, de qualquer época, e ainda assim se divertir. O poder de identificação é grande, também, visto que muitos de nós vivemos coisas que a turminha vive nas HQs. A Turma da Mônica fala com todo mundo. E também se adapta à época. Hoje temos personagens que têm blog, que pensam como uma criança atual. Mas preservando aquela... pureza, eu acho, de uma época em que tudo era mais simples.
Daniel Brandão - Os motivos do sucesso dos personagens do Maurício são múltiplos. Eles são universais, têm essências muito bem definidas, são muito humanos e de facílima identificação. Além do mais, depois de tantos anos, o Mauricio não deixou de ter o controle sobre a produção das histórias, já que todos os roteiros passam por sua aprovação. Além do mais, os personagens da Turma da Mônica conseguiram se adaptar muito bem às novas gerações.
Ricardo Manhães - Acho que, em primeiro lugar, o Mauricio viveu um pouco do universo que ele retrata com seus personagens, entendo que seja fundamental ter sido “testemunha” dessa infância típica brasileira, para poder navegar nesse universo com franqueza, e isso é sentido pelo leitor de alguma maneira. Acho também que o Mauricio é um exímio contador de histórias e, por saber brincar com valores tanto brasileiros quanto universais, sempre será sucesso.

Qual dos personagens da Turma da Mônica mais lhe interessava enquanto leitor?

Mário Cau - Sempre fui apaixonado pelo Louco. Nas HQs em que ele aparecia, geralmente transbordavam momentos surreais, nonsense, pirados mesmo, e além disso, as piadas. A interação dele com o Cebolinha sempre me divertia. Toda vez que eu pegava um gibi do Cebolinha, torcia pra ter pelo menos uma participação do Louco! O próprio Cebolinha, um eterno “loser”, com seus planos infalíveis, e uma paixonite secreta pela sua “maior inimiga”... Gostava do Horácio, mas só fui entendê-lo mais velho.
Daniel Brandão - O personagem do Maurício que eu mais gostava na infância era o Pelezinho. Sempre gostei muito de futebol e achava essa turminha muito divertida. Dentre o núcleo mais clássico, sou fã do Chico Bento e do Cascão. Eles são muito engraçados!
Ricardo Manhães - Lembro de ficar curioso com o Cascão, que não gostava de tomar banho, as interações do Cascão nas historias da Turma da Mônica eram sempre interessantes e engraçadas. E também me chamou a tenção o estilo de desenho do cabelo do Cascão, que era diferente dos traços do outros cabelos da turma.

Quais os valores que você usou dos personagens para imaginá-los mais velhos?
Mário Cau - Eu foco nas pessoas normais, e nos seus dilemas, achei interessante imaginar os personagens mais velhos justamente porque nós, enquanto envelhecemos, vamos perdendo aquela graça, aquela diversão, as cores, de quando éramos crianças. Vejo muitos adultos cinzas por aí. Gente que não percebe a vida como algo maravilhoso. Queria, então, incluindo o elemento fantástico do Louco na história, mostrar que às vezes um pouco de loucura faz bem, não se levar tão a sério e voltar a perceber que, sim, o mundo e a vida têm cores, mas somos nós que, gradativamente vamos esquecendo delas. Fisicamente, eles são jovens adultos normais, com roupas normais etc. Tive um pouco de trabalho em definir o Cebola, já que queria ele com mais cabelo. Optei, depois de uns testes, em fazer uma versão do que ele apresenta na Turma Jovem, pra não perder a referência. Cores também foram usadas pra remeter ao clássico, como a camisa verde do Cebola e a roupa vermelha da Mônica.
Daniel Brandão - Procurei manter a essência deles. Também me baseei na fortaleza da amizade entre eles. Escolhi os quatro personagens mais famosos, com um foco especial na Mônica e na Magali. Para mim, a amizade entre elas é eterna. Sempre achei que havia um amor platônico entre Mônica e o Cebolinha. Por isso, os imaginei casados. A Turma da Mônica, apesar de estar firme e forte e ser a leitura predileta da minha filha, por exemplo, para mim representa uma gostosa nostalgia.
Ricardo Manhães - No meu caso, fiz uma adaptação dos personagens do Mauricio em estilo franco-belga de desenho, mais precisamente no estilo da “Era de Ouro” das HQs de humor europeias, com grandes orelhas, nariz redondo e outras características típicas desse estilo de desenho. O fato de tê-los retratado na fase adulta permitiu dar continuidade e trazer para o “hoje” as características dos personagens. Esse truque, digamos assim, permitiu que o Cebolinha devolvesse uma coelhada na Mônica depois de fazer terapia.

Quais foram os primeiros livros e quadrinhos que você leu em sua infância? O que mais lembra deles?
Mário Cau - Eu tinha acesso a muitos gibis, ainda bem! Turma da Mônica e livros ilustrados em geral... Mas minhas memórias mais vívidas eram livros ilustrados de personagens Disney. Eram livros quadradinhos, com duas histórias cada, e uma fita-cassete que tinha aquela história narrada e com música. Era lindo. Tinha um livro do Pateta, também, onde ele apostava uma corrida de carros com o Donald, se não me engano, e claro, ele vence como a tartaruga vence a lebre... “devagar e sempre, se chega lá”! Eu assistia a muitos desenhos animados também, e tudo isso me influenciava diretamente. Aprendi a ler numa HQ do Cebolinha, com meu pai. Nunca esqueço.
Daniel Brandão - Os primeiros livros que li, ou que minha mãe leu para mim, eram de contos de fada. Os primeiros quadrinhos me marcaram mais. Adorava a Turma da Mônica e Os Trapalhões. Depois, com nove anos, descobri a Superaventuras Marvel e decidi fazer quadrinhos desde então. Os quadrinhos mudaram e salvaram a minha vida.
Ricardo Manhães - Os primeiros gibis com certeza foram os da Turma da Mônica, porém com oito anos de idade fui morar na França por quatro anos com meus pais e conheci todo um outro universo de HQs, como o Tintin, Gaston Lagaffe, Léonard le Génie, Spirou et Fantasio, que muito influenciaram meu estilo de desenho, assim como minha infância.


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