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Trata-se de dois jovens escritores que conseguiram conquistar espaços próprios na literatura contemporânea brasileira. Andrea del Fuego, vencedora em 2011 do prestigiado Prêmio Literário José Saramago com o livro Os Malaquias, e Santiago Nazarian com a literatura existencialista pop de seu mais recente livro, Biofobia. Ela quer saber dos processos dele. E as respostas estão aqui:
 
Andrea - O que faz entre a escrita de um livro e outro? O que faz no intervalo da escrita ainda é, de alguma maneira, relacionado ao ato?
 
Santiago - Minha ocupação principal é de tradutor, então sempre me acrescenta como autor, mesmo que eu traduza todo tipo de coisa, de livros de dieta a alta literatura, muita literatura juvenil, etc. Mas quando não estou trabalhando num livro me sinto bem inquieto, sinto uma espécie de solidão criativa, dos personagens... Talvez como se eu estivesse numa ilha deserta, ainda que pescando diariamente, deixando de construir a jangada...
 
Andrea - Escreveria mesmo que não houvesse leitores? Identifica em seus leitores algo seu?
 
Santiago - Antes de publicar eu tinha essa nítida convicção, de que continuaria escrevendo mesmo se nunca conseguisse publicar, só pelo prazer. E ainda tenho... em menor grau... o prazer e a convicção. Escrever, na verdade, é a parte prazerosa, a publicação é que é sofrida, as expectativas, as respostas, o retorno, a quantidade e a qualidade. Sempre lembro de uma amiga jornalista, que estava publicando o primeiro livro de ficção, cheia de receios do que poderiam interpretar com determinada passagem, determinada frase. E tive de avisar a ela: o mais frustrante é que provavelmente você nunca saberá nem se alguém leu isso. Meus livros são recheados de subtextos provocativos, incorreção, que nunca vejo mencionados. Biofobia, por exemplo, tem todo um subtexto satânico (deus em caixa baixa; Inferno em caixa alta, a questão da natureza detritiva, e por aí vai). Isso, se ecoa para alguém, fica lá, na cama dele. As resenhas são rasas ou, se aprofundam, vão por caminhos que não prevejo. Eu não consigo ler teses acadêmicas sobre minha obra, por exemplo; já recebi várias, fico honrado, mas não consigo ler. E não me identifico em meus leitores, não, mas essa é a parte interessante, ver o meu universo ecoando de formas tão distintas. 
 
Andrea - Até onde vai sua entrega para a literatura? Onde, na sua vida, a literatura perde? 
 
Santiago - Eu não tenho vida. É patético, mas é verdade. Não é uma questão de ser workaholic, de viver para o trabalho. Mas eu moro sozinho, não tenho filhos, minhas ocupações todas giram em torno da literatura... Acho tão estranho essa gente que se encontra no final de semana e “não vamos falar de trabalho”, vão falar sobre o quê? Sei lá, se estou lendo um livro, se estou vendo um filme, para mim tem a ver com trabalho, é um estudo. Não entendo como um escritor pode bater o cartão e não pensar na própria escrita por um final de semana. Bem, acho que o mais perto que tive disse foi num ano que morei em Florianópolis, de 2010 a 2011. Acho que lá conseguia me largar só pela atividade física, o contato com a natureza... Não fez muito bem para a minha carreira, de todo modo. 
 
Andrea - Como pensa seu percurso daqui por diante?
 
Santiago - Estou ainda trabalhando o Biofobia, adaptando para o teatro e para o cinema. Essa ideia de lançar o livro e ele “ganhar vida própria” nunca funcionou para mim. Então eu mesmo tenho de bater nas portas, buscar resenhas, oferecer para produtores, inscrever em editais; assim agora ganhamos o edital para o roteiro do filme. Se eu ficar esperando o transatlântico chegar à minha ilha, não vai acontecer. Sempre questiono se vou ter fôlego para embarcar em outra viagem, lançar novamente, me lançar novamente. Mas acho que apenas gosto de construir jangadas, mesmo que a maré as traga de volta. 

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