Quem tomou conhecimento ou assinou o abaixo-assinado pela candidatura da escritora Conceição Evaristo à uma vaga na Academia Brasileira de Letras em 2018, talvez não tenha atentado para o nome por trás da iniciativa: Diálogos Insubmissos de Mulheres Negras. Mas a bem da verdade, a ação está longe de ser desconhecida. Desde que surgiu há três anos, o Diálogos tem lotação garantida em tudo que promove, o que dá a ver um público ávido por conhecer, ouvir e interagir com autoras negras mais ou menos comentadas no campo literário. Aliás, este diagnóstico foi um dos motivos que fez a professora do Instituto Federal da Bahia (IFBA) e doutoranda em Literatura e Cultura na Universidade Federal da Bahia (UFBA), Dayse Sacramento, criar o projeto.
Em conversa com o Pernambuco, Dayse rememorou como tudo começou e contou também o que muda em 2020 com a ampliação das fronteiras do projeto por ações online. Na mesma medida que o Diálogos é uma ação de formação, ele também propõe novos paradigmas para o mercado editorial, além de uma revisão da crítica, porque como bem pontua: “é inegável o apagamento das escritoras negras, como da sua produção intelectual, aliadas ao epistemicídio direcionado aos conhecimentos produzidos sobre esta produção literária”.
O Diálogos Insubmissos de Mulheres Negras deseja rasurar a lógica racista e excludente do mercado editorial. Explica como nasceu a proposta, que acabou por se transformar também em um projeto de doutorado.
O Diálogos começou como uma experiência de pesquisa de PIBIC no IFBA, no qual sou docente de Língua Portuguesa, realizada com a estudante Jilmara de Jesus, e finalizada em 2017. Nela refletimos sobre os dados de violência contra as mulheres negras divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em 2016 e a representação deste imaginário na obra Insubmissas lágrimas de mulheres, de Conceição Evaristo. Sem muitas expectativas, mas com o desejo de visibilizar o resultado da pesquisa para a comunidade fora da instituição, convidamos as pesquisadoras negras de Salvador, Denise Carrascosa, Manoela Barbosa, Ana Carla Portela, Carla Akotirene, Cristian Sales, Lindinalva Barbosa, Samira Soares e Maiana Lima, para discutir as questões da violência a partir dos contos. Também criamos uma página no Facebook, contamos com o trabalho gráfico da designer soteropolitana Milla Carol, que criou a identidade visual. Desde o início, houve muita interação com a proposta e os registros das ações que eram disponibilizados na internet. Tudo isso foi traduzido em surpresa quando no primeiro encontro, em julho de 2017 na agenda do Julho das Pretas, em Salvador, contamos com a presença de cerca de 500 pessoas. Diante daquele público, senti como esta demanda poderia ser traduzida de muitas formas; entre elas, na carência de circuitos literários especificamente para mulheres negras, no seu protagonismo de fala, produção intelectual e produção artística. Além daquele, foram realizados outros três encontros, o último deles com a presença da escritora Conceição Evaristo. A partir daí senti a necessidade de mudar os caminhos da proposta inicial do meu projeto de pesquisa de doutorado porque desejava, a partir desta experiência, compreender as facetas da realização de eventos literários como uma ação fundamental da crítica literária e de que forma estas atividades podem impactar na cena literária. Afinal, é inegável o apagamento das escritoras negras, como da sua produção intelectual, aliadas ao epistemicídio direcionado aos conhecimentos produzidos sobre esta produção literária.
Além deste fato, o retorno do público reverberou imediatamente em convites para a participação de festas literárias e para a organização de atividades autogestionadas. Em três anos, foram mais de trinta eventos, o que revela duas questões que considero importantes e sobre as quais reflito na minha tese. Primeiro, a manutenção de atividades protagonizadas por mulheres negras, com dificuldades ocasionadas pela escassez de recursos, pela "desconfiança" sobre a qualidade do que se produz com a iniciativa, juntamente com o racismo editorial e institucional, é uma incômoda rasura no que se impôs como literatura brasileira oficial. Segundo, há um lócus, um silêncio ensurdecedor sobre a presença negra na cena nacional, como se o que até então foi produzido fosse reduzido de valor literário. Há pouca empatia com a expressão da literatura negra, com a acusação de ser esteticamente deslocada, desfocada, panfletária e todas as desonestas acusações que recebemos sobre o que parem nossas mãos pretas. Por estas e outras tantas questões, o Diálogos, além da proximidade com a produção artística-literária, serve de mote para incentivar a imprescindível reflexão sobre a monetização da arte de mulheres negras, afinal, houve o desdobramento em outras ações em que se contratou o Diálogos, a realização dos Dialoguinhos, debates realizados em escolas públicas com a presença das escritoras, dialogando com a comunidade discente sobre uma das suas obras; o Slam Insubmisso, competição de poesias entre jovens negras; o Ofó Obirin Dudu, lançamento coletivo de escritoras e autoras negras e a Casa Insubmissa de Mulheres Negras, primeira casa exclusivamente de escritoras negras no Brasil, que acontece pela terceira vez em 2020 como programação oficial da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).
Uma das marcas dos Diálogos é a possibilidade da audiência estar perto das autoras. Como essa proximidade, na sua opinião, pode causar impacto na formação leitora ou provocar uma mudança de repertório leitor nas escolas?
Rompemos com essa barreira entre o público e as escritoras e artistas negras que são tão de carne e osso como nós! Obviamente, mantemos e preservamos o respeito pelo lugar de artista de cada uma delas, mas incentivamos o contato físico, o pedido de autógrafo, a escuta de pé de ouvido, a selfie para rede social, a manifestação do afeto pelo abraço, a oportunidade de conversar sobre a obra, sobre o processo de produção de escrita. Nós, pessoas negras, fomos historicamente desumanizadas e relegadas ao sofrimento das práticas violentas impostas por uma colonialidade decadente, mas que se ressignifica a todo tempo como uma eficaz tecnologia de opressão, produção de desigualdades, e com a morte física e simbólica de sujeitos negros e do que produzimos artisticamente. A formação de público leitor é incentivada em combate a um dos primeiros impedimentos impetrados no mercado editorial, o acesso ao livro, o toque na capa, o cheiro do papel ao folhear. A circulação das obras, a possibilidade da aquisição e o aquecimento desse nicho de mercado editorial, ainda que seja uma rasura quase indetectável, são uma realidade que o Diálogos tem colocado em xeque. Negros escrevem literatura, leem, consomem livros, mas para isso o acesso precisa acontecer. Certamente, por esta e outras questões, são vergonhosas e vexatórias as condições de publicação para nós negras e negros no Brasil, inclusive a manutenção e a sobrevivência das nossas editoras.
Em números, o Diálogos contou até aqui com a participação de 31 escritoras negras, 35 pesquisadoras, esteve presente em cinco festas literárias, entre elas a Flip durante duas edições. São muitas realizações em um tempo relativamente curto. Ao que você credita a ampliação do projeto, bem como a sua necessidade de maior alcance?
Eu sou uma mulher de candomblé e uma das coisas que a vivência com a minha mãe de santo, Dona Marlene Rodrigues, me ensinou é que todas as pessoas num terreiro são importantes. Desde as que estão iniciando a sua trajetória na comunidade religiosa, quanto aquelas que colocaram o primeiro tijolo no terreiro. Salvaguardando as questões hierárquicas, todas as ações, desde as mais simples como a limpeza e manutenção do espaço físico, até as mais complexas que perpassam pelo cuidado e zelo espiritual são fundamentais para todo o processo. Da mesma forma, compreendo a gerência que empenho em cada atividade até então desenvolvida. Todas as pessoas que trabalham e constroem o Diálogos têm autonomia de ação dentro das suas funções, a escuta para cada detalhe é atenta e respeitosa, seja da produção, a forma cuidadosa como contatamos as escritoras e o cuidado com o público presente tornam o Diálogos um espaço de entretenimento, formação política e também de uma política de afetos que compreende a importância de cada pessoa que constrói as ações. Sem sombra de dúvidas, há uma observação importante a fazer, a perspectiva do Feminismo Negro de validação das experiências de mulheres negras como produção de conhecimento é uma das molas propulsoras da nossa metodologia. Não apenas numericamente, pois as estratégias de realização das atividades foram se aperfeiçoando no decorrer dos tempos, mas as contribuições que sempre chegam como elogios, críticas ou sugestões se dão a partir da participação direta ou indireta das pessoas nos eventos. Muitas mulheres já participaram de diversas atividades do Diálogos e o que percebo são gestualidades afetivas, solidárias, que passam pelo compartilhamento de cards em redes sociais, pelos convites e indicação para participação em atividades, pelos rateios financeiros quando a disposição de recursos poderia cancelar a realização das atividades, pela citação em trabalhos acadêmicos, pelo respeito que adquiriu a minha pesquisa ao incitar a visibilidade e o reconhecimento de vozes que são acadêmicas, artísticas, políticas, literárias. Em suma, as mulheres negras em rede formam o coro que vem cantando outras músicas e propondo outras danças para a letras negras que grafam outras histórias que contam sobre nós.
Uma lição importante sobre esse lugar de referência para outras mulheres negras é de que muitas de nós nunca tivemos experiências de protagonismo e isso me assustou um pouco no começo. Era como se eu não conseguisse aceitar o meu lugar de dona de uma ideia como o Diálogos. Recordo de uma conversa que tive com uma grande parceira, a jornalista e idealizadora do Portal SoteroPreta, Jamille Menezes, que foi enfática numa das minhas crises de insegurança e ansiedade sobre os rumos que este trabalho iria tomar: "Aceite ser dona e merecedora de uma ideia brilhante, isto tudo é seu, você divide conosco, mas quem pariu foi você! A senhora é a chefa, encare, aceite e siga!". Ela me soprou isso no ouvido com tanto afeto e sinceridade e eu não esqueci mais. Isto não me torna melhor do que ninguém, muito pelo contrário, me coloca num lugar de responsabilidade bem maior sobre a pesquisa e sobre esse trabalho. Uma experiência que rememoro quando penso no Diálogos foi aquela vivida entre Alice Walker e Zora Hudson. Ao escavar a história da escritora falecida décadas antes, Walker recupera e traz à tona o livro Seus olhos viam Deus (1937), que se torna uma obra bastante difundida e lida pela comunidade negra norte-americana. Assim tenho visto os esforços de pesquisadoras negras a respeito da obra de Maria Firmina dos Reis ou Carolina Maria de Jesus, ambas escritoras que, cada uma a seu tempo, teve a sua produção escanteada dos compêndios da historiografia literária brasileira. A justificativa? A cor escura da mão que escreve. Nesta mesma linha, o Diálogos assume o compromisso de promoção da escrita e da arte de mulheres negras como uma premissa que norteia os trabalhos até agora.
A professora Florentina Souza (UFBA) diz que a produção literária das mulheres negras pode ser lida como uma estratégia de resistência ao epistemicídio. Porém, para além da produção, a circulação desses textos é outra demanda. Como você observa a abertura do mercado para essa autoria?
Temos uma escassez de editoras negras, principalmente que publiquem mulheres negras. A gente tem um grupo de mulheres negras que tem destaque na produção, que tem visibilidade mas elas não estão em grandes editoras. Dois exemplos de editoras menores que rasuram e questionam o mercado editorial brasileiro são a Padê Editorial, com tatiana nascimento, e a Andarilha Edições, com Deisiane Barbosa. A Padê, através de um financiamento de edital, conseguiu publicar dezenas de livros de autoras LGBTIQ+. Acho importante quando a gente pensa a mulher negra e suas interseccionalidades. Basta lembrar que as sexualidades negras têm ainda menos visibilidade. Já Deisiane Barbosa é uma escritora do interior da Bahia, que faz livros manuais. É um trabalho recente e que tem a ver com a sua própria experiência de publicação. Acrescento ainda a questão da autopublicação, o que me lembra a escritora baiana Jovina Souza. Todos os seus livros foram publicados por ela mesma. Jovina financiou e promoveu a circulação. Chamo atenção para o fato de que as dinâmicas de publicação dessas mulheres são todas bastante trabalhosas, engenhosas e de alguma forma encontram as mesmas dificuldades que relatamos durante toda a nossa vida. Outro aspecto que é bastante importante e que Conceição Evaristo fala em vários momentos, é o envolvimento do Movimento Negro. Conceição diz que deve muito ao Movimento Negro e seu compromisso em disseminar a sua literatura, promover eventos, fazer circular o livro. A professora aposentada da UNEB, Maria Nazaré Mota de Lima, também reflete sobre o quanto é importante, sobretudo para professoras negras, pensar a formação de professores e a circulação dos livros, porque geralmente são as professoras que levam os livros para as universidades. Então, a partir dessas experiências, percebe-se que as coisas não estão muito fáceis pra nós.
Um debate imprescindível também diz respeito às políticas de citação, porque acredito que o acesso ao livro vai se dar quando você conhece o livro. As políticas de citação são uma forma de você ampliar o raio de ação de chegada dos livros. bell hooks alerta o quanto é importante nós, intelectuais negras, nos levarmos para os lugares porque a gente nem sempre vai contar com a solidariedade dos homens negros. Para concluir, uma outra experiência bastante interessante é a do Traduzindo Atlântico Negro, grupo de pesquisa coordenado por Denise Carrascosa (UFBA), que pensa as traduções dos livros de escritores negras de fora. As grandes editoras fazem as traduções, mas elas não dão a devida importância aos aspectos culturais e linguísticos da população negra nesse processo de produção e muitas vezes transmuta a ideia da autora nessa tradução. Então o Traduzindo o Atlântico Negro vem buscar isso, inclusive tem um livro com o mesmo nome, publicado pela editora soteropolitana Ogum’s Toques Negros.
E por fim a questão do recorte geopolítico das grandes editoras. Elas não publicam as mulheres negras, menos ainda nossa produção do Norte-Nordeste. Às vezes, escolhem uma das nossas mulheres como resposta para uma pauta identitária que resolveu peitar. Isso é bastante perigoso na minha avaliação.
Na Flip de 2016, Giovana Xavier (UFRJ) escreveu o manifesto Arraial da branquitude, reclamando a participação de mulheres e autoras negras no evento. A seguir teve um momento de muita efervescência para as escritoras negras. O que você acha que mudou de lá pra cá?
Foi sim um momento de bastante efervescência, mas é bem verdade que a negação do clamor pelo nome de Conceição demonstra que na verdade nós estamos em completa desvantagem nessa disputa de narrativas. De fato, foi muito significativo o Diálogos mobilizar um abaixo-assinado virtual, que contou com 22 mil assinaturas. Mas Conceição não está lá, nós não estamos. Nunca tivemos uma escritora negra na Academia Brasileira de Letras e as escritoras negras de grande alcance não estão no lugar de visibilidade a ponto de concorrer, por exemplo, a uma cadeira na Academia. A maior parte das escritoras com maior vendagem de livros também não está no Norte e Nordeste. A realização desse debate geopolítico é pra ser trazida de forma incisiva para a gente pensar do que tem sido feito pelas mulheres que, ainda nesse contexto de invisibilidade, de silenciamento, conseguem alguma projeção, mas não devem ser as únicas vozes escutadas no cenário da literatura nacional. É necessário ampliarmos a rede de citação e pensarmos em estratégias de solidariedade entre essas escritoras negras para que se tenha outras produções e outras mulheres em lugar de visibilidade. Destaco como exemplo Jarid Arraes. Ela tem vendagem, tem aceitação do público e está fazendo uma rasura importante, porque é uma escritora de cordel, um gênero literário que é extremamente estereotipado e visto de forma bastante equivocada. Ela precisou ir pra São Paulo, não está no Cariri (CE) para dar conta do lugar que tem.
Uma das principais preocupações do seu trabalho é com a profissionalização e a organização burocrática de escritoras. Como o Diálogos pensa essas questões?
Grandes lições que eu recebi do Diálogos foram a partir da convivência com a escritora mineira Cidinha da Silva, que além de ser a melhor cronista brasileira para mim, tem a carreira consolidada, com 13 livros já publicados. Ela conta com a organização que segue esses ditames da lógica empresarial, exigida para uma profissional que presta esse tipo de serviço, o que não é uma prática comum para a maioria das escritoras negras. Longe de mim, tratar de forma pejorativa a falta de habilidade que alguns profissionais têm de lidar com essa máquina burocrática. Eu mesma precisei estudar muito e tenho me aproximado dos estudos sobre o afroempreendedorismo, sobre como a gente se insere nessa lógica de mercado, buscando formação para lidar com esse gerenciamento cotidiano dos Diálogos. Além disso, Cidinha foi uma grande incentivadora e parceira do projeto porque, além de alertar sobre a necessidade de ocuparmos espaços onde muitos não nos deseja, como uma festa literária como a Flip, Cidinha é uma pesquisadora do campo da leitura. Ela organizou o livro Africanidades e relações raciais, em que trouxe uma grande fortuna crítica literária, polissêmica, sobre leitura e literatura no Brasil. Digo isso para gente pensar que essas escritoras, assim como a própria Conceição Evaristo, doutora em Literatura Comparada e com uma fortuna em crítica literária de mulheres negras, transmutam e caminham, por diversos caminhos na sua trajetória como escritoras.
Essa parte da profissionalização e da organização burocrática precisa de conhecimentos mínimos de produção. A escritora em si nem sempre dá conta, porque as mulheres negras precisam dar conta de uma grande dimensão de atividades, do trabalho, familiares, da vida pessoal, dos cuidados com a saúde, na dedicação à comunidade religiosa quando é o caso. Então são diversas questões que atravessam essa escritura, desde a ter uma fotografia para a divulgação com qualidade num cartaz até a emissão de uma nota fiscal ou a possibilidade de ter um CNPJ. Essa experiência me obrigou a criar metodologicamente uma forma de lidar com essas carências e fazer dar conta de estar em espaços necessários. Por exemplo, quando participo de uma atividade pelo qual vou receber um financiamento público, preciso fazer a emissão de uma nota fiscal. Eram coisas que eu nem imaginava como fazer, nem por onde começar.
Com os Diálogos, tanto metodologicamente como teoricamente, a gente vem criando muita coisa bacana. Os comentários da mediação a respeito dos livros que são trabalhados – por exemplo, destaco a mediação de Mayana Rocha sobre o livro Dia bonito pra chover, da escritora Lívia Natália. Mayana fez uma mediação muito qualificada teoricamente, mas que também levou pessoas às lágrimas, pela maneira como ela refletiu a respeito da produção de Lívia. Ela é doutoranda em Literatura e Cultura e tem feito um trabalho comprometido em cartografar a produção literária preta e sapatão. Enfim, para além da questão do conteúdo, tem a questão da forma. Uma coisa que eu percebo também é a preparação das pessoas para estarem no Diálogos. Isso porque reconhecem a seriedade do projeto. A gente não inventou a roda, ressalto que existem outras experiências literárias acontecendo na cidade, e dou destaque para mais outras duas atividades literárias na Bahia. Uma é presencial que é o Lendo Mulheres Negras, um coletivo que se reúne para discutir mensalmente a produção literária de escritores negras a partir de uma obra e o projeto Escritoras Negras da Bahia, realizado pela pesquisadora da UnB, Calila das Mercês. Essa última mapeou quem são essas escritoras, um trabalho fundamental nesse circuito literário baiano e que coloca a Bahia em um lugar de destaque de projeção dessa literatura.
O ano de 2020 é marcado por novos empreendimentos do Diálogos. Gostaria que você explicasse esses novos projetos e o que mais está previsto daqui pra frente.
Neste ano, o Diálogos realmente extrapola a curadoria de eventos, para pensar essas questões de formação. Os novos empreendimentos são na verdade três. Primeiro, a transformação do perfil no Instagram, onde vamos começar a produzir conteúdo crítico especializado em literatura de mulheres negras. Já os cursos online são cursos a respeito dessa historiografia da produção literária de escritoras negras e pensando de forma bastante ampla. Tem gente que hoje não sabe o que é um slam, o que se faz lá. Eu pretendo organizar esses cursos pensando no público geral, mas focando ainda mais no público docente, estudantes universitários que estão nas licenciaturas, porque a escola é um espaço extremamente importante para a formação da competência leitora e a utilização dos nossos textos literários, das escritoras negras, é uma das possibilidades de ressignificação do contexto racial que a gente vivencia ainda hoje no Brasil. É um combate também à lógica colonialista e ler mulheres negras, escritoras negras é um ato de insubmissão. Até o final do ano, começamos o Clube de Leitura Insubmisso, inicialmente de forma virtual, mas que a gente quer transformar numa ação de estímulo a leitura mais ampliada, mas sobre a qual ainda estamos estudando.