Ineditos Morgenstern fev18

 

Os poemas fazem parte do livro Palmström, do poeta alemão Christian Morgenstern, que será publicado em 2018 pela Relicário Edições. Morgenstern (1871–1914) foi contemporâneo dos dadaístas e expressionistas germânicos. É reconhecido pela composição de versos em estilo nonsense, em sua língua natal.

A tradução é do poeta Ricardo Domeneck.

 

Palmström

Palmström vai ao lago
e abre, grande, um lenço vermelho:
no lenço há o desenho
de um homem a ler e um carvalho.

Palmström o vê e não ousa assoar-se –
ele é destes seres esquisitos
que se sentem desnudar-se
de veneração por tudo o que é lindo.

Ele dobra de novo, todo delicado,
o que acabara de desdobrar,
e ninguém sensível há de acusá-lo
por ir embora sem se assoar.

 

 

A vila boêmia

Palmstrôm viaja com o Sr. Émile
para um certo vilarejo boêmio.

Entende bulhufas do que lá se fala,
da primeira até a última palavra.

Até o Sr. Émile (que só pela rima
viajou) está perdidinho da silva.

Mas é justo isso o que tanto o alegra.
Feliz até os ossos, volta nosso colega.

Então escreve em sua coluna de jornal:
Mais uma viagem cheia de sex appeal!

 

Para o norte

Palmström ora sofre de neuroses;
por isso dorme virado para o norte.

Pois dormir rumo sul, oeste, leste
causa-lhe fadiga no peito e mente.

(Quando alguém vive na Europa
e não ao sul entre os Trópicos.)

Tal pode-se ler em dois eruditos
e até Dickens já está convencido –

que este fenômeno se desvenda
pela força magnética do planeta.

Palmström cura-se de forma coorde-
nada, pega a cama, põe para o norte.

E em seus sonhos, algumas vezes,
ouve a raposa polar uivar na neve.

 

Anti-horário

Ao relatar isso ao Sr. Émile,
este sentiu-se um pouco senil;

pois para ele sempre foi óbvio
obedecer-se o sentido rotatório

da Terra, ao dormir, com os pés
do seu corpo exatos rumo leste.

E por isso brinca, airoso-ácido:
Não, meu divã é anti-horário!

 


Isolamento sonoro

Em parte, protege-se de barulhos alheios,
em parte, insula-se do ouvido de terceiros.
Palmström adora enrodilhar-se em sons.

Por isso é que ele deixa em seu quarto
o encanamento d'água ter explosões.
E dá-se, assim enovelado, que não raro

passe horas a recitar monólogos, longos
monólogos, feito o tagarela de Atenas,
que no incêndio gritava em pleno fogo

assim como à orla do mar, Demóstenes.

 


O salmão

O salmão do Reno ia pelo Reno
até entrar Suíça adentro.

Subia de curso em curso, saltava
de queda em queda d'água.

Já estava ele deussabeonde,
quando um belo dia – ôxe! -

deu de cara com uma represa
de uns doze pés ou sessenta!

Até os dez pés ele saltava bem.
Mas aí acabou sua coragem.

O salmão ficou por três semanas
aos pés alpinos de uma cabana.

Mudo, por fim deu meia-volta
e nadou rumo à Holanda.

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