Os poemas fazem parte do livro Palmström, do poeta alemão Christian Morgenstern, que será publicado em 2018 pela Relicário Edições. Morgenstern (1871–1914) foi contemporâneo dos dadaístas e expressionistas germânicos. É reconhecido pela composição de versos em estilo nonsense, em sua língua natal.
A tradução é do poeta Ricardo Domeneck.
Palmström
Palmström vai ao lago
e abre, grande, um lenço vermelho:
no lenço há o desenho
de um homem a ler e um carvalho.
Palmström o vê e não ousa assoar-se –
ele é destes seres esquisitos
que se sentem desnudar-se
de veneração por tudo o que é lindo.
Ele dobra de novo, todo delicado,
o que acabara de desdobrar,
e ninguém sensível há de acusá-lo
por ir embora sem se assoar.
A vila boêmia
Palmstrôm viaja com o Sr. Émile
para um certo vilarejo boêmio.
Entende bulhufas do que lá se fala,
da primeira até a última palavra.
Até o Sr. Émile (que só pela rima
viajou) está perdidinho da silva.
Mas é justo isso o que tanto o alegra.
Feliz até os ossos, volta nosso colega.
Então escreve em sua coluna de jornal:
Mais uma viagem cheia de sex appeal!
Para o norte
Palmström ora sofre de neuroses;
por isso dorme virado para o norte.
Pois dormir rumo sul, oeste, leste
causa-lhe fadiga no peito e mente.
(Quando alguém vive na Europa
e não ao sul entre os Trópicos.)
Tal pode-se ler em dois eruditos
e até Dickens já está convencido –
que este fenômeno se desvenda
pela força magnética do planeta.
Palmström cura-se de forma coorde-
nada, pega a cama, põe para o norte.
E em seus sonhos, algumas vezes,
ouve a raposa polar uivar na neve.
Anti-horário
Ao relatar isso ao Sr. Émile,
este sentiu-se um pouco senil;
pois para ele sempre foi óbvio
obedecer-se o sentido rotatório
da Terra, ao dormir, com os pés
do seu corpo exatos rumo leste.
E por isso brinca, airoso-ácido:
Não, meu divã é anti-horário!
Isolamento sonoro
Em parte, protege-se de barulhos alheios,
em parte, insula-se do ouvido de terceiros.
Palmström adora enrodilhar-se em sons.
Por isso é que ele deixa em seu quarto
o encanamento d'água ter explosões.
E dá-se, assim enovelado, que não raro
passe horas a recitar monólogos, longos
monólogos, feito o tagarela de Atenas,
que no incêndio gritava em pleno fogo
assim como à orla do mar, Demóstenes.
O salmão
O salmão do Reno ia pelo Reno
até entrar Suíça adentro.
Subia de curso em curso, saltava
de queda em queda d'água.
Já estava ele deussabeonde,
quando um belo dia – ôxe! -
deu de cara com uma represa
de uns doze pés ou sessenta!
Até os dez pés ele saltava bem.
Mas aí acabou sua coragem.
O salmão ficou por três semanas
aos pés alpinos de uma cabana.
Mudo, por fim deu meia-volta
e nadou rumo à Holanda.