Cem anos do Vampiro de Curitiba

Dalton Trevisan levou uma vida reservada durante toda a carreira literária e faleceu as vésperas de seu centenário, celebrado neste sábado (14)

Frame do curta-metragem sobre o arquivo de Dalton Trevisan
Frame do curta-metragem sobre o arquivo de Dalton Trevisan

Foi exatamente há 100 anos, no dia 14 de junho de 1925, que Dalton Jérson Trevisan nasceu, na cidade de Curitiba. Filho de João Evaristo Trevisan e Catarina Stocchero Trevisan, estudou no tradicional Colégio Estadual do Paraná e, mais tarde, formou-se em Direito na Universidade Federal do Paraná (UFPR), tendo atuado como advogado por alguns anos.

Mesmo envolto na advocacia, Dalton enveredou por outros caminhos e chegou a trabalhar como crítico de cinema e repórter policial, também tendo fundado com os amigos Erasmo Pilotto e Poty Lazzarotto a revista literária Joaquim. O veículo não manteve uma periodicidade regular durante os três anos em circulação, porém foi uma porta de entrada considerável para Trevisan, que atuava como editor e que nela publicou seus primeiros contos.

Com a experiência da construção de histórias, Dalton publicou os livros Sonetos ao luar, em 1949, e Sete anos de pastor. No entanto, três anos depois, o escritor renega ambas as obras e considera como seu livro de estreia Novelas nada exemplares, de 1959. Este trabalho rendeu ao autor uma fama crescente por todo o território nacional, assim como o primeiro de quatro prêmios Jabutis que viria a acumular (1960, 1965, 1995, 2011). Com uma diversidade de obras de contos publicadas com o passar dos anos, Dalton Trevisan também recebeu os prêmios Ministério da Cultura de Literatura, Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras (ABL), Portugal Telecom de Literatura Brasileira, atual Oceanos e o Prêmio Camões.

Pródigo, publicou mais de 50 livros, incluindo os famosos Cemitério de elefantes (1964), Contos eróticos (1984), A guerra conjugal (1975), Macho não ganha flor (2006), o primeiro e único romance A polaquinha (2013) e talvez sua mais famosa obra, O vampiro de Curitiba (1984), de onde ganhou o apelido para si mesmo.

Durante toda a vida e carreira na literatura, Dalton se manteve impassível em não aparecer mais do que suas obras. Pouco falava com a imprensa que o procurava para conversar sobre seus livros, afirmando sempre que tudo o que desejava dizer já estava posto em seus contos, expostos para quem quisesse ler. Mesmo assim, em raras ocasiões concedeu entrevistas, como uma ao também escritor e jornalista Luiz Vilela, publicada originalmente no Jornal da Tarde em 1968.

Na ocasião, Dalton explicou: “Escrever é a única justificativa que encontro para estar vivo. Meus gestos cotidianos são vazios. Mesmo o amor e o sexo; o sexo dura muito pouco tempo. As outras coisas? Eu não tenho o dom de ganhar dinheiro; nem ambição de poder. Escrever é uma atividade inútil, mas, para mim, ainda é a menos inútil de todas e a que me faz continuar vivo. E qual a compensação de escrever? Uma frase boa que a gente cria, uma imagem, coisas assim, que agradam num momento e no dia seguinte já nos deixam insatisfeitos. O escritor troca a sua vida por nada”.

No dia 9 de dezembro de 2024, Dalton faleceu aos 99 anos. A notícia foi comunicada em uma nota da família, divulgada nas redes sociais e rapidamente repercutida em todo o Brasil. Pouco antes de morrer, o escritor doou seu extenso arquivo de fotografias, jornais, livros, cartas e rascunhos para o Instituto Moreira Salles (IMS) “por ter plena ciência da importância do material estar disponível para pesquisa e provocar uma série de novas discussões sobre a obra”.

Assim, em celebração ao centenário desse exímio contista curitibano, o IMS irá disponibilizar na sexta-feira (13), em seu canal do YouTube um curta-metragem de Matheus Balbino, produzido em sua homenagem. O filme traz uma pluralidade de recortes da vida de Dalton, contendo um registro inédito do autor aos 99 anos, em sua residência.

Os seus livros, que representam a vida dedicada à escrita, também entram no cenário de comemoração, uma vez que a Todavia acaba de publicar edições inéditas de O vampiro de Curitiba, Ah, é?, Chorinho brejeiro, Pão e sangue, O beijo na nuca e Desgracida. Além destes, a editora também lança a antologia de contos Educação sentimental do vampiro, organizada por Caetano W. Galindo e Felipe Hirsch.

Ao longo dos anos, a Todavia promete publicar mais 30 livros de Dalton Trevisan.