Em junho de 2018 um novo canal surgiu no Youtube. O primeiro vídeo, datado daquele mesmo ano, consistia em uma ilustração de um coelho branco e uma música instrumental de fundo. Depois deste, os vídeos que se seguiram se tornaram cada vez mais estranhos. Sob o nome Uketsu, o canal segue ativo em 2025 e soma quase 2 milhões de inscritos e 218 milhões de visualizações.
Sempre trajado de preto e com uma máscara branca texturizada de papel machê, a pessoa por trás desse canal permanece totalmente anônima, mas em 2020, um dos vídeos que produziu o tornou conhecido por todo o Japão. Com pouco mais de 20 minutos, o youtuber conta a história de um escritor envolvido com o ocultismo que se depara com uma planta arquitetônica incomum. De vídeo viral, a história se transformou em um livro best seller.
Casas estranhas vendeu cerca de 1,8 milhões de exemplares em todo o mundo e em 2025 o título chegou ao Brasil pela editora Intrínseca, somando mais de 30 mil cópias vendidas. Na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, que aconteceu em junho, o livro esteve entre os mais vendidos da editora.
A história é a mesma antes narrada por Uketsu em seu canal no Youtube: Um jornalista/escritor fascinado pelo ocultismo recebe a planta baixa de uma casa que está à venda na cidade de Tóquio por um casal antes interessado em comprá-la, mas ao visitar a construção e se deparar com um layout estranho, sentiram que a melhor opção era desistir da compra. A partir desse contato, o narrador procura o auxílio de um amigo arquiteto a fim de compreender as possíveis razões para aquela estranha construção.
De maneira geral, a leitura é bastante fluída, porém não pela técnica literária empregada no texto ou pelo sentimento que prevalece nas palavras. Acima de todo o resto, Casas estranhas é uma obra de enorme simplicidade.
Do primeiro momento da narrativa até o fim dela, o livro parece ter sido retirado de um fórum online e consiste quase como um relato feito a amigos. Esse estilo totalmente despretensioso, contudo, funciona na narração do livro justamente porque a história que o autor se propõe a contar se parece com os relatos disponíveis na internet (muitas vezes fantasiosos). De poucas páginas e com linguagem cotidiana, a leitura de Casas estranhas pode ser feita em poucas horas e sequer necessita de atenção especial.
Para além da forma, o mistério do livro é extravagante, porém se desenrola de maneira quase infantil. O narrador da obra possui uma dúvida e quase imediatamente o arquiteto surge com uma possibilidade capaz de saná-la. Linear, a história não possui grandes twists e se concentra em narrar as descobertas ao leitor.
Além de Casas estranhas, o Brasil ganhou mais um livro de Uketsu: Imagens estranhas. Os dois títulos foram lançados quase concomitantemente e este segundo foi publicado pelo selo Suma, da Companhia das Letras.
Assim como o anterior, Imagens estranhas chama o leitor para o cerne do mistério e o convida a desvendá-lo, mas desta vez são desenhos quase infantis que fazem a história girar. Mais uma vez, as ideias definitivamente estão presentes ali, mas a falta de um aspecto literário prejudica a obra.
Talvez por estar no começo de sua carreira, Uketsu não mostra identidade em sua escrita, seus personagens são quase como robôs e mesmo tratando de assuntos que poderiam a vir ser explorados de mil formas, todos os assuntos tratados no livro são rasos. A falta de uma escrita propriamente literária é um fator, mas a falta de sentimento é algo que atrapalha ainda mais o leitor de se aproximar verdadeiramente da história.
Uketsu não parece ter encontrado uma voz narrativa dentro de suas obras, o que contribui para torná-las não memoráveis, apesar das ideias interessantes para o desenrolar dos mistérios. De maneira geral, todas as pistas aparecem facilmente e a história nunca se distancia de um tom quase infantil.