“Eu nunca decidi escrever, não. Eu me lembro que eu fui obrigada a escrever e eu detestava escrever. Mas, rapidinho, eu me apaixonei. É bom demais escrever. Eu não paro mais de escrever.”
Heloísa Teixeira, membro da Academia Brasileira de Letras, autora de Rebeldes e marginais: Cultura nos anos de chumbo (1960-1970), Feminista eu? Literatura, Cinema Novo, MPB, Onde é que eu estou - todos pela Bazar do Tempo, e de 26 poetas hoje (Labor do Brasil, 1975) e Macunaíma, da literatura ao cinema (José Olympio, 1978).
“Acho que nunca tomei essa decisão. Ainda criança, escrevia cartas para as pessoas que não sabiam ler, nem escrever. Depois, recebia encomendas de discursos, redações, esquetes teatrais, narrativas curtas... às vezes me pagavam por esses trabalhos. À medida que eu progredia nos estudos, as encomendas aumentavam, sobretudo para o teatro. Já no Recife, convivendo com escritores famosos, nunca me imaginei igual a eles, no máximo, seria um biógrafo dessa gente. Mesmo sem as encomendas de antes, continuava escrevendo por hábito. Até o dia em que participei de concursos e publiquei livros despretensiosos. O jornalista Mário Hélio me estimulava a escrever e me oferecia oportunidades de publicar. Um dia, o famoso professor da USP, Davi Arrigucci Jr., leu o meu livro de contos As noites e os dias, conseguiu meu telefone e ligou para mim e falou: Você está escrevendo no escuro, precisa publicar em boas editoras e ser lido pelo Brasil. Apresentou-me à CosacNaify e escreveu o posfácio do meu livro Faca. Foi assim.
Algo parecido aconteceu com Tchekhov, que também era médico como eu.”
Ronaldo Correia de Brito, médico, escritor e colunista da revista Pernambuco.
“Ser escritora hoje é viver o desafio de encontrar boas histórias que dialoguem com a renovação da linguagem que está ao nosso redor, um processo que não para de acontecer.
A arte e a literatura são as antenas da linguagem, as escritoras e os escritores são quem as operam.”
Morgana Kretzmann, autora de Água turva, publicado pela Companhia das Letras, e vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura, com seu romance de estreia, Ao pó (Patuá), em 2021.
“Curioso, gosto de dizer que escrevo, mas não sei se gosto tanto de me declarar escritora. Parece que a expressão meio que fixa o imapeável da palavra num espaço-tempo, e a mim pelo menos sempre interessa guardar (para o poema especialmente, que é o que me faz visita) alguns domínios mais irmãos do sussurro, o que passa. Que arranjo tão único de vascularidade – o que avança ali, no corpo desse coração cravado onde se escreve. Esses dias vi no insta do Tarso [de Melo] algo de José Tolentino Mendonça: “O poema segue as premissas da guerrilha urbana. Jamais revela identidades e endereços. Estabelece que pontos de contato não sejam escritos, apenas memorizados […]”. Ser escritora, pra mim, é estar profundamente atenta aos movimentos dessa guerrilha, que é da língua e é da vida.
Mar Becker, autora de Cova profunda é a boca das mulheres estranhas (Fóstoro) A mulher submersa (Urutau), Sal (Assírio & Alvim Brasil) e Canção derruída (Assírio & Alvim Brasil).
“Escrever é uma aventura.
É um ato de coragem e, penso, um pouquinho de insanidade.
Escrever é político, é bater o pé e mostrar que você tem algo a dizer – mesmo quando parece que ninguém mais quer escutar o outro.
Escrever é uma loucura, mesmo. Mas, também, pode ser maravilhoso, porque do outro lado, ainda existe quem se emocione com as palavras, quem aperte um livro com força nas mãos e pense “que bonito” e isso ninguém pode tirar da gente, não importa o tamanho do caos”.
Marcela Dantés, autora de Vento vazio (Companhia das Letras). Seu primeiro romance, Nem sinal de asas (2020, Patuá), foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura e do Jabuti.
“Acredito que somos todos escritores, alguns lançam livros, outros morrem sem colocar um pingo num “i”, o que separa um do outro é a circunstância. Mas falando da literatura como ofício, penso que só quem tem ilusões face a própria insignificância se sujeita ao enfrentamento de uma página em branco. A gente começa valente, sustentada por uma habilidade, chancelados, às vezes, pelo valor da história, e no exercício exigente que a literatura impõe, a pessoa escritora vai ficando subjugada ao texto, e começa a compreender da própria pequenez. A gente acaba descobrindo que o mundo inteiro se faz dessas pequenezas, e por isso, voltamos.
O antídoto pra mim é proteger o espaço de criação. Proteger até dos leitores. É engraçado que vem a voz da minha avó, ”Fazê é uma coisa, cumê é outra.”
Eu marco meu território, onde eu trabalho minha linguagem, apartada inclusive dos elogios: no final das contas, tudo é defesa de discurso, e os discursos mudam.
Sobre inteligência artificial, a falta de políticas públicas para garantir que possamos nos desenvolver — e assim, desenvolver a nossa literatura, me assusta mais que um computador que me simula.”
Jeovanna Vieira, jornalista e autora do livro de poemas Deserto sozinha (Pedregulho, 2023). Virgínia mordida é seu romance de estreia, cuja primeira versão foi finalista do Prêmio Kindle de Literatura, e é publicado pela Companhia das Letras.
“A semente do desejo de escrever surgiu cedo. Ajudou ver meu pai sempre com um livro nas mãos. Foi um autodidata que aprendeu a ler aos dezesseis anos e se tornou leitor assíduo. Aos meus nove anos, achou uma obra-prima o que escrevi num caderno de escola. Incentivo para que eu continuasse. Aos meus doze, ele morreu me deixando aquela semente. Na adolescência escrevi poesia, que nunca ousei publicar. E fiz várias tentativas de romance, cujos resultados não me satisfaziam. Teria desistido se não houvesse uma razão fundamental: eu sentia a necessidade incontornável, com o tempo que a escrita permite, de exprimir inquietações, explorar dúvidas e reagir ao mundo ao meu redor. Em resumo diria que sou escritor por uma necessidade interior.
João Almino, escritor e diplomata brasileiro, membro da Academia Brasileira de Letras. Autor de Homem de papel, Entre facas, algodão, Ideias para onde passar o fim do mundo, entre outros.
Eu acredito que a inteligência artificial não ameaça e não ameaçará jamais o trabalho dos escritores e das escritoras. Eu acho que a literatura está preservada nesse sentido e a nossa tarefa hoje acho que é a mesma de sempre: nós devemos contar histórias produzindo significação dentro das nossas comunidades e até dentro da comunidade global promovendo a interação entre leitores e o mundo natural, o que nos cerca. Eu acho que a IA nesse sentido não tem acesso algum ao que nos cerca, ao mundo natural e também a natureza interior de cada um. Acho que a literatura segue viva.
Luiz Henrique Pellanda, é cronista, contista e músico. Autor de O caçador chegou tarde, O caçador chegou tarde, O detetive à deriva, entre outros